UMA FESTA PARA BORIS
Considerada a primeira grande peça teatral do austríaco Thomas Bernhard, Uma festa para Boris chega ao Brasil ajudando, pouco a pouco, a suprir a lacuna de dramaturgia do autor no cenário nacional. Cultuado por inúmeros escritores do mundo todo — como Bernardo Carvalho e Horacio Castellanos Moya — pelos seus romances hipnóticos e furiosos que criaram uma dicção própria e contagiosa, Thomas Bernhard se mostra ainda mais provocador nas suas peças.
Já no primeiro contato com Uma festa para Boris, o leitor (ou espectador) é confrontado com um universo que costuma ser tratado com muita cautela e correção política — o dos deficientes físicos. No entanto, Bernhard, que nunca mediu palavras, dá voz a uma mulher conhecida apenas com o apodo irônico de “A Bondosa”, que verbaliza vitupérios e crueldades dirigidos a todos, tanto aos internados no asilo quanto a seu marido, Boris, e à sua assistente.
Interpretada sob uma chave existencialista logo que foi encenada, como um retrato atroz da paralisia da sociedade burguesa, Uma festa para Boris traz no seu mundo aleijados que mesclam humor sombrio e desespero para tratar da própria condição. Daí surgiram comparações com Beckett e leituras contaminadas pelo sucesso do movimento capitaneado por Sartre. Distantes desse contexto, podemos agora apreciar o estilo bernhardiano pelo que oferece de mais radical: sua construção rítmica, que conduz a um final apoteótico de ruído e insanidade, transmitida com precisão pelos tradutores.
Antônio Xerxenesky
autor de Uma tristeza infinita